sábado, 10 de maio de 2008

Tá quieto macaquinho

Sempre que se fala em igualdade, há gente que entra em transe, com visões de multidões uniformes, vestidas de túnicas azuis em marcha para glória do Grande Colectivo Opressor. Depois de recuperarem do transe, limpam a saliva meio-seca do canto da boca, lá se endireitam e recitam:
Todos somos diferentes, a ideia de igualdade impõe uma coacção sobre o indivíduo que é intolerável face ao princípio maior que é a liberdade, - e muitas outras coisas que se podem ler em blogues muito concorridos da nossa praça. Além do mais, também se pode ler de forma mais ou menos implícita, a igualdade não é natural, e a sua imposição desvirtua o princípio da competição através da qual os mais fortes garantirão as vigorosas gerações futuras.
Diz a teoria económica ortodoxa que um tipo deve contentar-se com maximizar o que consegue ganhar, e que é indiferente o que o vizinho do lado ganha. Presumo eu que é com base neste princípio que surgem ideias com a abolição de ordenados mínimos e de contratos colectivos. Cada um negoceia o seu o melhor que pode, e os outros não têm nada com isso.
Um trabalho com macacos capuchinho relata um comportamento curioso. A dois macacos é dada uma recompensa em comida, no caso pepino. Enquanto ambos recebem o mesmo pela tarefa, corre tudo bem. Se a um deles for dado consistentemente menos, o seu comportamento altera-se, revoltando-se, rejeitando fazer a tarefa ou a comer o que lhe dão.
Isto, aos olhos das pessoas e da teoria económica descritas lá em cima, é irracional. Ele deveria aceitar o bocado de pepino mais pequeno, que sempre é melhor que nada. Mas o macaco não sabe economia, ele apenas sabe que está a ser enganado, e como o seu comportamento evoluiu num sistema social em que a cooperação é essencial, e em que todos devem sentir que o seu esforço é igualmente recompensado, recusa-se a entrar no jogo até ser reposta justiça. Faz greve!
Aqui cabe uma correcção. O macaco talvez saiba economia, na verdade, só que não é neo-clássica… chamemos-lhe economia natural?
As mesmas pessoas lá de cima costumam dizer que não se pode mudar a natureza humana. E chamam utopias a todas as tentativas de organização politica e económica das sociedades quem tentem contrariá-la.
Dou-lhes toda a razão: qualquer sistema que não tenha em conta a natureza humana está condenado ao fracasso e a cobrar um preço intolerável a quem a ele estiver submetido.
Agora, macacos me mordam se o ser humano é como eles o pintam.


De Luís Rodrigues, retirado daqui.

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